Ipea diz que sitema proposto mantém o mesmo orçamento destinado às políticas de proteção, mas dobra o impacto sobre a desigualdade e a pobreza
A criação de um novo sistema de proteção social, a partir da fusão de programas hoje existentes, permitirá a inclusão de 17 milhões de crianças brasileiras em situação de vulnerabilidade que não recebem benefício do governo federal. A projeção está no estudo “Uma proposta para a unificação dos benefícios sociais de crianças, jovens e adultos pobres e vulneráveis”, divulgado nesta segunda-feira (02) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
A proposta é integrar o Bolsa Família, o Salário-Família, o Abono Salarial e a Dedução por Dependente no Imposto de Renda da Pessoa Física, políticas públicas voltadas à proteção da infância e dos vulneráveis à pobreza no país. No estudo, os pesquisadores Sergei Soares, Leticia Bartholo e Rafael Guerreiro Osório avaliam que o sistema de proteção social em vigor é uma colcha de retalhos, construída ao longo dos anos, mas com buracos e sobreposições.
O estudo exemplifica: 1,6 milhão de crianças recebem Salário-Família e Bolsa Família, outras 400 mil crianças recebem Salário Família e dedução no Imposto de Renda. Na outra ponta, de um total de 52 milhões de crianças no Brasil, 17 milhões não têm benefício social. “Podemos juntar esses programas e criar um novo sistema que abrangeria todos os que recebem esses benefícios e os 17 milhões que não recebem”, afirma Soares.
A base do novo sistema de proteção social passa necessariamente pela manutenção do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal e mantém o monitoramento de educação e saúde, mas necessita de mudanças na legislação em vigor, incluindo proposta de emenda constitucional (PEC). “Nossa proposta é uma integração, utilizando o Cadastro Único, que possibilitará maior abrangência, controle e transparência desses benefícios de proteção social”, diz Bartholo.
Princípios
A integração dos quatro programas leva em consideração sete princípios. O primeiro deles combina equilíbrio fiscal e responsabilidade social. Ou seja, a fusão dos benefícios não extrapola os R$ 52,8 bilhões destinados às políticas de proteção à infância e à pobreza. Esse valor também não pode ser reduzido. Ou seja, com o mesmo orçamento será possível atender todas as crianças, aumentar a cobertura dos pobres e ter o dobro do impacto sobre a desigualdade no país.
Os outros princípios são: a definição da pobreza pela renda familiar per capita, flexibilidade para adaptação a mudanças sociais e demográficas, uso do Cadastro Único como mecanismo de identificação dos pobres, linha única de elegibilidade (R$ 250,00), benefícios sem cortes abruptos e reajustes periódicos das linhas definidoras de pobreza e dos valores dos benefícios.
A unificação dos benefícios de proteção social também vai acelerar a redução da pobreza e da desigualdade no Brasil. O sistema atual reduz a desigualdade em um ponto do índice Gini (que mede a desigualdade) e a pobreza em 1,5 a 2,2 pontos. Segundo o estudo, a integração dos quatro programas pode dobrar o impacto sobre a desigualdade e a pobreza no país.
O sistema proposto pelos pesquisadores prevê três benefícios: um de R$ 45 reais por criança e jovem com menos de 18 anos de idade, universal e independente da renda, o segundo de R$ 90 por criança de até quatro anos, pagos integralmente até a linha de elegibilidade e regressivo à medida que a renda aumentasse. O terceiro seria um benefício focalizado na pobreza extrema, com valor de R$ 44,00, pago a todos nessa condição, com ou sem filhos.
A adoção dos princípios norteadores da proposta, segundo os pesquisadores, possibilita uma variedade de desenhos da estrutura de benefícios. As propostas do estudo mesclam benefícios universais sem critério de renda com benefícios focalizados em função da renda, com um período de transição. “Nossa preocupação maior deve ser alcançar os mais vulneráveis e não apenas evitar incluir os não elegíveis no programa”, defende Osorio.